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Jovens, pandemia e revolução digital

Ph. EFE

Juan E. Notaro
Presidente Executivo do FONPLATA – Banco de Desenvolvimento

Uma das frases que mais ouvimos no início da pandemia era que “a COVID não atinge os jovens”. Infelizmente, a variante Delta do vírus e as consequências econômicas da emergência sanitária demonstraram que essa afirmação não era totalmente correta.

Embora seja verdade que os organismos jovens têm melhor resposta imune, a evolução do vírus, o fato de ter privilegiado a vacinação da população mais vulnerável e a atitude menos cautelosa da juventude diante das medidas sanitárias resultaram no aumento de hospitalizações de jovens e crianças.

Porém, o que mais me concerne como responsável por uma instituição de desenvolvimento são as consequências econômicas da pandemia nas pessoas entre 15 e 24 anos, especialmente na América Latina e, em particular, na América do Sul.

Estudo recente da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) aponta que mais da metade dos jovens que deixaram de trabalhar por causa da crise sanitária foi por demissão ou pelo fechamento das empresas, ou ainda porque as medidas de confinamento truncaram seus empreendimentos ou seus empregos informais.

O mesmo documento assinala que a taxa de ocupação média nessa faixa etária caiu em torno de 8% nos primeiros meses da pandemia, com consequências muito dolorosas em termos econômicos, mas também emocionais.

A CEPAL aponta, ainda, que das pessoas entre 18 e 29 anos que não têm acesso ao mercado de trabalho na região, 11% são homens e 33% mulheres, muitas delas dedicadas a atividades não remuneradas, como atividades de cuidados, dentre outras. O panorama piora entre as mulheres indígenas e afrodescendentes.

Paradoxalmente, a pandemia também contribuiu para uma expansão sem precedentes de uma área na qual a juventude tem grandes vantagens. Refiro-me, é claro, às plataformas e soluções digitais.

Um estudo da consultora McKinsey assinala que, em termos de adoção de novas plataformas e tecnologias (e o crescimento de algumas já existentes, como o e-commerce), o “salto” foi de cinco anos.

Isto é, plataformas, soluções, aplicativos, métodos de trabalho que não teríamos visto ou incorporado ao nosso cotidiano até 2025. Os impactos deste fenômeno já são sentidos. Muitas empresas já estão se adaptando ao fato de que o teletrabalho, por exemplo, chegou para ficar.

Então, se a população jovem foi severamente afetada pelo desemprego e um dos setores que mais cresceu durante a pandemia é, justamente, o que melhor dominam os jovens, o que deveríamos fazer como sociedade?

Se a perda de empregos entre os jovens atingiu de forma desproporcional às mulheres, quais ações deveríamos tomar para corrigir essa iniquidade?

A resposta é óbvia: aproveitemos o enorme desenvolvimento das plataformas educacionais digitais para treinar jovens nas ferramentas de trabalho do futuro. Usemos seu potencial criativo para impulsionar novos empreendimentos baseados em tecnologia, abramos as portas ao financiamento deste tipo de iniciativas.

A brecha de gênero, também no âmbito digital, demanda ações específicas: garantir que mulheres jovens e meninas tenham dispositivos e acesso à internet para explorar possibilidades de capacitação e emprego, bem como de acesso a serviços essenciais.

Fomentemos as carreiras em ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEM) entre mulheres e meninas para que elas também possam participar desta revolução digital e incorporar-se plenamente ao mundo hiperconectado.

O desafio é fazê-lo, e fazê-lo bem, numa região heterogênea em termos políticos, geográficos e sociais. O esforço requer, além do mais, investimentos significativos em infraestrutura, desenvolvimento de novos sistemas, aprovação de novos marcos legais e reguladores, sobretudo no âmbito do trabalho.

Também exige criatividade para ampliar as possibilidades numa região na qual a maioria dos investimentos e desenvolvimentos tecnológicos se concentram nas plataformas de transporte e de tele-entregas, especialmente de alimentos.

Em outras palavras, o futuro pós-pandemia tem que ser digital e muito criativo, e tem que envolver os jovens e as mulheres. Nós, que trabalhamos em organizações de desenvolvimento, temos que focar em garantir as condições para torná-lo possível.

Texto publicado originalmente na coluna mensal de Juan E. Notaro no Huffington Post.

Fontes consultadas: 
https://www.mckinsey.com/business-functions/mckinsey-digital/our-insights/the-covid-19-recovery-will-be-digital-a-plan-for-the-first-90-days  
https://blogs.worldbank.org/education/reimagining-youth-skills-development-inclusive-recovery  
https://www.cepal.org/es/noticias/la-pandemia-ha-acentuado-la-incertidumbre-contexto-exige-que-jovenes-desarrollen 
https://www.eleconomista.com.mx/empresas/Pandemia-Covid-19-golpea-fuertemente-empleo-juvenil-en-America-Latina-y-el-Caribe-Cepal-20210408-0043.html 

https://www.ilo.org/caribbean/newsroom/WCMS_774028/lang--en/index.htm 

13/09/2021